(Setembro de 2012, Stade de France, Paris. O grupo de música sai do palco e vai entrando, um a um, no meio da multidão, vão se unindo em uma só voz, e vão crescendo, e crescendo, e são maiores do que si, e são um só. São “Eles contra o mundo”.)
Existe uma música do grupo britânico Coldplay chamada “Us against the world” que diz…
Oh morning come bursting, the clouds. Amen.
Lift off this blindfold let me see again
And bring back the water, let your ships roll in
In my heart she left a hole
A manhã vem surgindo, as nuvens. Amém.
Levante esta venda, deixe-me ver de novo.
E trazer de volta a água, deixe seus navios navegarem.
Em meu coração, ela deixou um vazio
“Ela deixou um vazio”… Este é o sentimento após estes 3 meses ao perceber o quanto aprendemos juntos na disciplina (“Ela”) “A poética do ensaio”**, de Prof. Lourival Holanda.
Aprendemos com os teóricos, com os poetas, com nós mesmos, e sempre sentindo, experimentando na pele e na alma Montaigne (01/04/13)…
O desejo de conhecimento é o mais natural. Experimentamos todos os meios suscetíveis de satisfazê-lo, e quando a razão não basta, apelamos para a experiência.
(MONTAIGNE, Michel Eyquem de. Ensaios. 3º volume. 2ª edição. Tradução de Sérgio Milliet. Brasília: Universidade de Brasília, Hucitec, 1987, p. 348).
… sentindo a Poesia atravessar nosso corpo feito uma onda elétrica, os pêlos arrepiando nos versos recitados de Fernando Pessoa pelo Prof. Lourival (22/04/13)…
Foi um Momento
O em que pousaste
Sobre o meu braço,
Num movimento
Mais de cansaço
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não?
Não sei. Mas lembro
E sinto ainda
Qualquer memória
Fixa e corpórea
Onde pousaste
A mão que teve
Qualquer sentido
Incompreendido.
Mas tão de leve!…
Tudo isto é nada,
Mas numa estrada
Como é a vida
Há muita coisa Incompreendida…
Sei eu se quando
A tua mão
Senti pousando
Sobre o meu braço,
E um pouco, um pouco,
No coração,
Não houve um ritmo
Novo no espaço?
Como se tu,
Sem o querer,
Em mim tocasses
Para dizer
Qualquer mistério,
Súbito e etéreo,
Que nem soubesses
Que tinha ser.
Assim a brisa
Nos ramos diz
Sem o saber
Uma imprecisa
Coisa feliz.
(Fernando Pessoa, in “Cancioneiro”)
… ou a pureza de Walter Benjamin em “Rua de Mão dupla” lida por nosso colega Paulo Carvalho (10/05/13)…
CRIANÇA LENDO. Da biblioteca da escola recebe-se um livro. Nas classes inferiores é feita uma distribuição. Só uma vez e outra ousa-se um desejo. Muitas vezes vêem-se livros cobiçosamente desejados chegar a outras mãos. Por fim, recebia-se o seu. Por uma semana estava-se inteiramente entregue ao empuxo do texto, que envolvia branda e secretamente, densa e incessantemente como flocos de neve. Dentro dele se entrava com confiança sem limites. Quietude do livro, que seduzia mais e mais.
… ou o ser contraditório que somos todos nós em Walt Whitman (01/04/13)…
(…)
O passado e o presente definham… já os enchi e esvaziei,
Passo a encher minha próxima dobra de futuro.
Vocês que me escutam aí em cima! Você aí… algum segredo pra me contar?
Me encare enquanto assopro o discreto poente,
Seja sincero, ninguém está te ouvindo, só vou ficar mais um minuto.
Me contradigo?
Tudo bem, então… me contradigo;
Sou vasto… contenho multidões.
(…)
(Walt Whitman, extraído de “Folhas da Relva – Canção de mim mesmo”)
… a honra e o privilégio em dividir o mesmo teto, respirar o mesmo ar de Antonio Ailton, Ricardo Nonato, Fernando de Mendonça (e tantos mais)…
Grande é o mundo, nós o dominaremos
com a pequenina flor salpicada de crianças
e vendavais
(Antonio Ailton)
Quem parte
Na promessa de voltar
Sabe ser a saudade
Um presente habitado.
(Ricardo Nonato)
E cresceu assim, crente de que ‘seria grande’ para ser escritor, de que ‘seria escritor’ para ser grande.
(Fernando de Mendonça)
Tento “trazer de volta a água” que nossos “navios navegaram”; ela se esvai no tempo, “amarele-sendo, amarele-sendo” feito a fotografia…
Obrigada Prof. Lourival, Priscila, André, Cilene, Ailton, Fernando, Márcia, Ricardo, Cassiana, Roberta, Diogo, Thiago, Hudson, Vinícius, Ingrid, Mirella, Érika, Suelany (e Paulo, e Fátima, e Álisson, e quem mais faltar!) por tudo o que vocês nos ofereceram de maneira tão e tão generosa…
E chegamos ao dia 10/06/13, a 14ª aula na contagem do nosso organizadíssimo André Santos.
Sentimo-nos sós, fazendo o que não concordamos muito em fazer, mas que o sistema nos exige (Priscila), fazendo milagres (Diogo), tentando quebrar o que é evidente porque “o evidente é perigoso” (Prof. Lourival)…
– O ensaio nos põe em movimento. (Prof. Lourival).
E este movimento que não permite “a água estagnada”, “apodrecida” você nos ensinou, Prof. Lourival, ou melhor, como tantas vezes insistiu, você nos ajudou a descobrirmos sozinhos, sem estarmos sós, porque “um a um” fomos “entrando no meio da multidão” de teóricos, na imensidão dos poéticos, na infinitude da alma dos colegas que nos “deixavam à vontade” (Fernando) para navegar de um extremo a outro, da teoria à prática, do estudo da Literatura e Poesia à entrega a Literatura e Poesia, feito o amante se entrega nos braços do ser amado, feito nós estamos talvez não prontos, mas “maiores do que si”, e somos “um só” para dividir poemas, teorias, “ideias sempre em movimento” (Márcia) para não estagnar, “roçando o poema” (Hudson) porque ele sempre nos escapa, tentando sempre “constituir um outro agenciamento deste corpo sem órgãos” (Paulo)…
Supondo que digamos sim a um único instante, com isso estamos dizendo sim não só a nós mesmos, mas a toda existência. Pois não há nada apenas para si, nem em nós e nem nas coisas: e se apenas por uma única vez nossa alma tiver vibrado e ressoado de felicidade, como uma corda, então todas as eternidades foram necessárias para suscitar esse evento – e nesse único instante de nosso ‘sim’ toda eternidade terá sido aprovada, redimida, justificada e afirmada.
(Friedrich Nietzsche em “A vontade de potência” em “O ensaio como forma” em “Notas de Literatura I”, Theodor W. Adorno, Tradução e apresentação: Jorge M. B. de Almeida, São Paulo: Duas Cidades; Editora 34, 2012 (2ª edição), p. 45).
Um até breve, um até logo, um até mais, com todo carinho e gratidão, um abraço bem, bem, bem da colega
Patricia Tenório.
Meu nome contém
Uma ponte intransponível
Patricia
Da pátria
Patricia
Sem pátria
De uma margem
A outra do rio
Não me aquieto
Não pouso os pés
Quero-me artista
Quero-me entranhada
Nos livros de teoria
Mas não me sinto
Em casa
Nem aqui
Nem acolá
Ou me sinto
Em casa
Quando estou inteira
Aqui
Quando me deixo banhar
Acolá
No rio dos outros mestres
Nas palavras
Dos poetas
Dos teóricos
Mostrando caminhos
Guiando sentimentos
Até me encontrar
Sozinha
Com meu nome
E nada mais
(Poema sem Pátria, Patricia Tenório, 06/06/13)
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* Todos os direitos reservados a Coldplay Live 2012.
** Disciplina “A poética do ensaio” ministrada pelo prof. dr. Lourival Holanda, no período de março a junho de 2013, no Centro de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Pernambuco.