α. presente
tarde
tarda
alarme
que fala
que arde
que geme
de tarde
que fica
cidade
que falo
cidade
em meio a tua carne
te rasgo
e penetro teu âmago
por entre veias
e ruelas
onde cachorros dão o ar
da graça
[…]
β. pretérito
noutro dia
vem
vem outro sol
o mesmo
de outro dia
o mesmo
de mil oitocentos e setenta e sete
o mesmo
de quinze
de cinquenta e oito
o mesmo
deste quinze
e meu avô ri
e quase eu também rio
menos o rio
que goteja
seus últimos goles d’água
que lacrimeja
suas últimas gotas
[…]
γ. pretérito mais-que-perfeito
a manhã desagua
a cidade
se adentra
eu a mergulho
em meio ao sossego matutino que um mendigo
o quebra com chacoalhar de moedas em um
caneco de alumínio às dez e dezessete da
manhã
a vagar sem destino
sem prisão
a vagar consigo mesmo
a vagar entre ponteiros de relógios
que somente marcam
a hora de comer
e a hora do cochilo
vaga
[…]
δ. futuro
tantos
se foram
tantos
como meu avô foi na década de quarenta
por trinta dias rasgando mar adentro
até o rio de janeiro
o mundo existe
fora dos mapas
é grande
é bonito
e é feio
vovô me disse
duvido
e sempre duvidei
de tantas verdades
[…]
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* Extraídos de À Cidade. Mailson Furtado Viana. Ilustração: Renancio C. Monte e Mailson Furtado Viana. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2017.
** Contatos: mailog10@hotmail.com e https://www.facebook.com/Improvisosdemailsonfurtado/